quarta-feira, 16 de dezembro de 2009






Mais uma vez abro espaço no meu território sagrado (este blog, ora bolas!) para dois textos do sempre excelente Marcelo Coelho. Só um cara genial pode ser tão dicotômico a ponto de escrever textos longos, críticos, rebuscados, com embasamento histórico e filosófico na Folha de São Paulo e ao mesmo tempo crônicas do dia-a-dia, na linguagem simples e direta, como faz com seu alter-ego Voltaire de Souza, que povoou as páginas sanguinolentas do Notícias Populares (ou NP para os íntimos) e hoje é presença diária no jornal Agora.

Muito bom! Se eu tivesse prestado mais atenção às aulas do cara, não estaria aqui apenas babando ovo...Rarara!

SACOLA DA SORTE


Natal. Tempo de compras.
Elenice tinha uma loja de roupas no interior de Minas.
Como sempre nesta época do ano, a jovem se dirigiu ao Bom Retiro.
Atacadistas. Butiques. Ofertas.
-Isso tudo vai vender como água em Montes Claros.
O Corsa 93 estava abarrotado de sacolas.
Chuvas. Enchentes. Inundação.
O Corsa começou a boiar na Marginal.
Elenice abriu a porta. Água até o pescoço.
As sacolas de plástico se perdiam na enxurrada.
-Não é possível... é um pesadelo...
Um caminhoneiro ajudou Elenice a sair do sufoco.
Ela ainda teve tempo de pegar uma sacola no lamaçal.
Foi grande a surpresa quando Elenice abriu a sacola.
Não eram roupas de butique. Mas sim milhares de dólares.
Propina saída de um carro oficial encalhado ali perto.
Com o caminhoneiro Girardes, a jovem planeja o réveillon em Cancún.
No mar de lama, nem tudo o que está boiando merece nosso desprezo.

AQUARELA DO BRASIL


Escândalos abalam o país.
O dr. Correia tinha muito poder no Distrito Federal.
A televisão mostrara o político enchendo os bolsos com dinheiro vivo.
-Um momento. Posso dar explicações.
Ele tirou uma longa lista do bolso.
-O dinheiro é para uma série de doações de caridade.
Correia foi enumerando tudo com muito método.
-Trezentos mil para a Biblioteca Comunitária Mamãe Gansa.
Os repórteres ouviam atentamente.
-Quinhentos mil para plantar o Coqueiro que dá Coco.
Os olhos de Correia estavam estranhamente fixos.
-Um milhão para botar o Rei Congo no Congado.
A voz de Correia assumiu um ritmo mais animado.
-Quinhentos para o Quilombo do Mulato Inzoneiro.
Sons de batucada se ouviram ao longe. Já era a preparação de um desfile carnavalesco.
-O resto é para todo esse meu Brasil brasileiro.
Alguns políticos são como karaokê. Quando falta assunto, entra o samba-exaltação.

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